Do interior do Brasil para o pódio mundial

João "Baixinho" saiu de sua cidade, no interior do Rio Grande do Norte, para vencer o campeonato mundial de jiu-jítsu no sábado (18). Mas teve de dormir no aeroporto de São Paulo e dividir um quartinho sem água nem luz para chegar lá
LAURA LOPES
Arquivo
O lutador de jiu-jítsu, que venceu o mundial em sua categoria. Exemplo de perseverança
Ele só estudou até a quarta série, ganha um salário mínimo por mês e saiu de uma cidade de 10 mil habitantes do Rio Grande do Norte para se consagrar campeão mundial de jiu-jítsu em sua categoria, galo, na faixa marrom. João Emidio, o João "Baixinho", deixou Alto do Rodrigues com R$ 200 no bolso e uma passagem de ida e volta para São Paulo, tudo patrocinado pela prefeitura de sua cidade. Na capital paulista, teve de pernoitar no aeroporto, porque a pessoa que iria buscá-lo havia ido embora quando chegou, às 23h30 da quinta-feira passada (16). No dia seguinte, encontrou com colegas de Natal que o levaram a um quartinho "sem água, nem luz, nem colchão", no centro de São Paulo, onde ficou até domingo. "Se tivesse que pagar, eu ficava devendo", diz. Foi a primeira viagem de João para fora de seu Estado. O título que conquistou no sábado (18), contra um atleta forte da tradicional família Gracie, o deixou abalado. "Estava tão 'aerado' com o título que confundi o voo de volta para Natal. Fui para o aeroporto no domingo, mas a passagem era para segunda", afirma, rindo. Como não sabia para onde ir, pediu socorro a um velho amigo, que arrumou acomodação para passar a noite. "Eu sonhava com esse título".
Há oito meses na faixa marrom, João tem 1,63 metro de altura e pesa 55 quilos. Começou a treinar jiu-jítsu há 14 anos, mas só em 2006 filiou-se à Confederação Brasileira de Jiu-Jítsu Esportivo. Das oito vezes que participou de campeonatos de vale-tudo, "no interiorzinho", como ele se refere às cidades do Rio Grande do Norte, permaneceu invicto. Nas horas vagas do trabalho pesado na construção civil dá treino a alunos em uma pequena academia de Alto do Rodrigues, de graça. "Nos fins de semana vou para Natal treinar pesado e pegar as aulas para dar na minha cidade", afirma. Ele se prepara para os próximos mundiais.

Apesar do esforço, não sabe como será o futuro. "Eu tive que correr atrás para conseguir ir ao campeonato", diz, referindo-se ao apoio que recebeu da prefeitura e da inscrição no mundial, paga por um amigo – além da acomodação em São Paulo. Segundo Rafael Fernandes, que treinou com ele na década de 90, João é um exemplo de perseverança e conquista. Na última vez que as chuvas causaram terríveis enchentes no Nordeste, o atleta viu sua casa, alugada, inundada. Teve que levar a esposa e os dois filhos para morarem na academia, provisoriamente. "Se esse cara não for um exemplo de vida, não sei em que buscar força nos meus dias de tristeza", afirma Fernandes, consultor de sistemas de informática, que hoje mora no Rio de Janeiro.
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